Anatomia da MPB

Sem dúvida nenhuma, a grande responsável por todo e qualquer tipo de mudança é a famigerada mídia.

REVISTA VICEJAR - ATUALIDADE E COMPORTAMENTO


A música faz parte de nossa vida e gostamos de tê-la como companhia no nosso dia a dia. Pelas ondas do rádio, diversas melodias compõem o fundo musical nos momentos de lazer e, se possível, nas horas de trabalho também. Quando se ama, então, ela é um complemento ideal para os momentos a dois. As músicas do passado nos remetem a momentos que marcaram a nossa vida e deixaram saudade.

As de hoje, no entanto, são tocadas à exaustão nas rádios e apresentadas repetidas vezes pela TV. Sem nos darmos conta, deixamos de ser ouvintes e passamos a meros consumidores de músicas de qualidade duvidosa. A massificação de um estilo faz com que a maioria da população acostume-se com a imposição de um determinado ritmo, sem avaliar se são bons ou não. Simplesmente consome-se passivamente aquilo que é oferecido, sem questionar nem letra, nem música.

Durante algum tempo, o excesso de músicas sertanejas e pagodes nas rádios e TVs já vinha incomodando muita gente que não gostava desses estilos. Mas até aí, digamos, tudo bem, pois, para quem gosta (é claro), são ritmos agradáveis e com letras simples e de fácil assimilação, apesar de muitas vezes repetitivas e “açucaradas”... Outras, “amargas” demais!

Há algum tempo surgiu o Axé, um ritmo contagiante, muito apropriado para a época de carnaval, mas que acaba “enchendo” o ano inteiro. Já a grande maioria das letras é ruim e prima pelo “esquartejamento” do corpo humano, destacando partes da anatomia. O excesso de termos como “bundinha” e “peitinhos” nas letras desses neo-compositores já atingiu o extremo do mau gosto.

Entretanto, quando parecia que a música brasileira já tinha chegado ao fundo do poço, eis que emerge das profundezas a tal “Onda Funk”. Essa crítica não é propriamente ao ritmo funk, pois existem composições com conteúdo e muito agradáveis de serem ouvidas. Refiro-me, isso sim, a malfadada “Onda Funk” veiculada constantemente pelas emissoras de rádio e TV, cujas letras vieram como tsunami para sepultar o que restava de bom senso musical.

Alguns aspectos chamam a atenção nessa, para muitos, nova onda anti-cultural. Primeiramente, é que tratam-se de letras agressivas, com dose exagerada de violência. A anatomia, porém, continua a ser dissecada. Antigamente, os pedaços humanos começaram pegando carona num “Bonde do Tigrão” e pelo tal de “um tapinha não dói”. Desde então, surgiram muitas (de)composições do gênero e, apesar de o “Bonde” ter parado de circular há algum tempo, se não dói na pele, certamente consegue ferir nossos ouvidos.

Deve também ser destacado que antigamente havia muitas formas de enaltecer a beleza e a sensualidade feminina, que foram reduzidas simplesmente a “popozudas” e “gostosonas”. As referências “zoo-românticas” também mudaram. A mulher que antes era chamada de gata, felina ou tigresa, passou a ser taxada de “cachorra”, e, curiosamente, muitos incorporam o termo e acham isso lindo e maravilhoso. A fartura de duplo sentido nas composições é tácito atestado de total falta de sentido mais refinado.

Até para quem gosta de músicas sertanejas, aquelas conhecidas por “música raiz”, agora tem que se conformar (ou não) com o chamado “sertanejo universitário”. Se compararmos a qualidade das letras desse gênero de hoje, com aquelas compostas por pessoas que antigamente até já foram consideradas semi-analfabetas, entendo que o saldo é amplamente desfavorável ao segmento que se diz “de nível superior”.  

Sem dúvida nenhuma, a grande responsável por todo e qualquer tipo de mudança é a famigerada mídia. Ela impõe um padrão musical que lhe convém e todos acabam quase que obrigados a consumir músicas de gosto discutível. Apesar de não apreciar “Ondas” como a de Axé, Funk, ou de outro tipo que seja, não sou contra a divulgação desses gêneros. Só não concordo com a veiculação excessiva e exclusivamente desse tipo de música.

Para finalizar, se fizermos um balanço dos termos mais usados nas composições, de um passado não muito distante, com certeza teremos profusão de pezinhos, joelhinhos, coxas, pernas, bundinha, umbiguinho, peitinhos, mãozinhas, bracinhos e pescocinho. Enfim, quase que uma aula de anatomia num ritmo lamentável qualquer. A partir desse levantamento, em que percorremos quase todo o corpo humano, podemos concluir que nas composições atuais, o que mais tem faltado é cabeça pensante, capaz de fazer letras e músicas com um mínimo de qualidade.


 TEXTO: Paulo Cesar Paschoalini 
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O articulista atua como colaborador deste Blog e o texto acima expressa somente o ponto de vista do autor, sendo o conteúdo de sua total responsabilidade.

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