Crises necessárias

É preciso acolher a crise, sem deixar que ela nos destrua ou tire nossa vontade de viver.

REVISTA VICEJAR – ARTIGOS E OPINIÕES


Durante vários séculos a humanidade conviveu com a impotência sobre grande parte das doenças e pragas, que às vezes dizimavam comunidades inteiras. Também a fome, gerada pelas dificuldades de um modo de vida, que padecia à mercê dos humores da natureza, causava grande penar às pessoas.

Incutia-se no pensamento do mundo ocidental que o martírio, tal qual aquele sofrido por Jesus Cristo, era o único caminho para a salvação e a máxima que pregava “o sofrimento como forma de purificação” espalhava-se feito fogo em palha seca por todo o Ocidente.

Mas o advento do desenvolvimento científico e as conquistas alcançadas pela medicina em função desse progresso começaram a mudar esse cenário. Agora era possível desafiar a foice da morte e sair ileso por um longo período durante a vida adulta e a velhice.

Esses fatores, somados à abundância proporcionada pelo novo modo de vida baseado no desenvolvimento industrial, gerou a ideia de que o prazer e a felicidade sim é que eram os objetivos da humanidade. O pêndulo invertia seu movimento.

Hoje, vivemos num mundo onde essas duas metas são obsessões tão marcantes que, ao menor sinal de crise, usa-se um batalhão de recursos para tentar suspendê-la. Remédios, tecnologia, opções de lazer abundantes e outros tipos de fuga envolvem as pessoas em um falso casulo, aonde acreditam erroneamente que não precisarão enfrentá-las.

Mas as crises são necessárias!

Não que devamos procurá-las, mas tampouco devemos evitá-las. É preciso vivenciá-las, de preferência apoiados em pessoas com capacidade para ajudar na compreensão de seu propósito, de modo a superá-las e, com isso, dar um ou alguns passos a mais na escalada da evolução espiritual.

Parafraseando o Padre Fábio de Melo em seu livro "Quando o sofrimento bater à sua porta", é preciso acolher a crise, sem deixar que ela nos destrua ou tire nossa vontade de viver.

Da maneira como vivemos hoje, fazendo da crise um vilão extremamente perigoso, o maior dos demônios, talvez acabamos por criar um exército de pessoas despreparadas para suas investidas futuras e que certamente virão.

A crise é uma possibilidade de aprender novos conceitos, novas capacidades e, se bem trabalhada e resolvida, é uma bela chance para uma maior compreensão sobre a vida, o Universo, a criação, e, principalmente, sobre si mesmo.

O mestre indiano Osho, em um de seus discursos, abordou a ideia de que tudo na existência funciona como um pêndulo, que hora movimenta-se para um lado, ora para outro. E, ao movimentar-se para um dos lados, gera e acumula energia contrária na mesma proporção de seu deslocamento. Ou seja, o movimento de volta terá o mesmo impulso e a mesma força da trajetória para qual está se dirigindo.

Fugir de toda e qualquer crise, buscando obsessivamente o prazer e a felicidade, é empurrar o pêndulo cada vez mais para um dos lados, gerando e acumulando energia para que ele retorne de forma provavelmente catastrófica para o outro lado.

As técnicas de meditação são uma poderosa aliada para atravessar as crises e evoluir com elas, diminuindo seus efeitos nefastos e aumentando os momentos de paz e serenidade. E o estudo filosófico constrói a base de sustentação dessa evolução.



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