Tarde no sertão

“Vivemos ladeados de alegrias e tristezas. E são esses resquícios de emoções, que constituem nosso ser.”

REVISTA VICEJAR - LITERATURA ( Crônica )


Durante uma tarde, de um mês qualquer. Eu caminhava entre algumas ruas pavimentadas de paralelepípedos. Empoeiradas e impregnadas de terra, carregavam em si as marcas da secura do tempo. Distraída, avistei a carreata de um circo, que recentemente havia chegado naquela pequena cidade, localizada em pleno sertão paraibano.

Logo, os curiosos se acomodaram sobre os parapeitos das janelas de suas casas. Acenando felizes para os palhaços sorridentes e brincalhões. Enquanto isso, o locutor em alto e bom som, anunciava as atrações do espetáculo circense.

Sorri em ver aquela cena, o pacato interior, agora teria uma programação: um circo modesto, com simples artistas e mirradinhas bailarinas. No entanto, todos se mostravam animados de poder estar ali, naquele lugar. Contentes, eles seguiram, aclamados pelos populares, que a cada momento maravilhavam-se feito crianças.

Até que de repente, pelas ironias, acasos ou imprevistos da vida, algo inesperado aconteceu. Ao converter uma esquina, o desfile do circo acabou se deparando com um cortejo funerário. Imediatamente, a alegria dos senhores do riso foi substituída por feições desoladas. Diante do fato, o locutor antes falante, calou-se e a música emudeceu-se.

Não me recordo o número exato de pessoas que participavam do funeral e nem qual era o nome do protagonista daquele enterro. Só me lembro que os palhaços, desconcertados, ofereceram condolências ao defunto, fizeram o sinal da cruz e, assim, prosseguiram silenciosos e introspectivos.

Na linha tênue da vida, estamos sempre tentando nos equilibrar. Entre ela e a morte está nossa existência. Vivemos ladeados de alegrias e tristezas. E são esses resquícios de emoções, que constituem nosso ser. Filosofias à parte, a vida escorria em forma de suor, naquela tarde cálida, típica do sertão.

Com meus olhos, acompanhei o cortejo funerário até o fim de uma rua. Longinquamente, uma música infantil voltou a ecoar na cidade. Era o desfile do circo, com seus palhaços distribuindo alegria. Entre a onipotência das serras, o Sol se inibia ocultando sua face. Proclamava sem cerimônias, o final de mais um dia.








 TEXTO: Mayanna Velame 
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