Educação, palmeiras e sabiás

“Segue-se o vendaval de nunca criar raízes, os olhos vão se acostumando a não ver e a acumular muito sem guardar memória.”

REVISTA VICEJAR – ARTIGOS E OPINIÕES


Coisas simples, pequenas; e a gente não nota...

Basicamente devido à velocidade de informação em detrimento do conhecimento, nós acabamos não tendo ouvidos para momentos que, a bem da verdade, são de uma singularidade ímpar na nossa trajetória. A educação e o governo já há muito tempo – e eu não canso de repetir isso – nos querem emburricados: seja nas memórias do passado (excesso de saudosismo), seja no medo do futuro por novas tendências de progresso.

Tenho comigo uma eterna desconfiança em pessoas demasiadamente pretéritas ou utopistas, quando muito, são antípodas desastrados ganhando palanque de onde se sentem seguros.

Nessa linha, segue-se o vendaval de nunca criar raízes, os olhos vão se acostumando a não ver e a acumular muito sem guardar memória. Mais que isso, aparentemente estamos descendo ladeira abaixo: o ensino básico não ajuda, o superior é mais boçalidade de financiamento do que conteúdo; e a grande moda agora não é lembrar –  é esquecer.

Ignorando o mais elementar: que não se faz um país sem luta, ademais, enquanto a bandeira do Ministério da Educação quiser varrer ideologias e enfeitar tudo com ornamentos, só nos restará amnésia cultural.

Ou, ao contrário e pior, alguns aprenderam a façanha de produzir memória estática e sem vida. Daí gritam aos sete ventos:

 "– No meu tempo sim era bom! Era diferente. A escola era boa!".

Ah, caro leitor, um conselho de amigo: corte caminho desses “plantadores de palmeiras em vaso raso”. Podem até falar de terras “onde cantam sabiás”, mas esquecem de que o exílio daquilo que se ama é que molda o verdadeiro artista. Este precisa sofrer pela distância e não se acomodar na calmaria.

 Já hoje, alguns falam como se tivessem partido, embora – quando o assunto é instrução – nunca tenhamos ido a lugar algum. Falam saudosos como se houvessem deixado o Brasil por quatro ou cinco décadas e, somente agora, enxergassem o caos que aqui está. Eles até cantam o exílio, mas não têm memória.

Desejar o antigo como instituição escolar, simplesmente por indução mental ou ansiando um ensino silencioso, pode ser útil: se estiver disposto a ser mero objeto de aprendizado, em prateleira e enfileirado; iludindo a mente de que o ensino industrializado e fabril foi libertador para educação brasileira; crendo que as palmatórias ou as filas indianas podem moldar o caráter.


Enfim, em pleno sec. XXI, pugnar pela velha "educação que nos convêm" [dos anos 60], é ter memória curta, operária... 








 TEXTO: Flaviano Roque 
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