“O tempo corre lá fora, crescemos como árvores, florescemos, geramos frutos bons e ruins”
REVISTA VICEJAR - LITERATURA ( Crônica )
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Olhamos para o espelho, percebemos os arcos que o bigode chinês forma no contorno da boca. A tristeza disfarçada de sorriso reluz em cada semblante. As rugas impregnadas na feição franzina anunciam as pegadas do tempo sobre a superfície árida da pele.
As pálpebras baixas, os olhos ofuscados, o delinear do rosto maculado. A vida nos parece ser perecível. Lembramos da época de criança, em que tudo nos assegurava ser permitido; sonhar, brincar, empinar pipa, voar com os aviões.
As nuvens do céu não eram gotículas de água, mas sim ovelhas prontas a pastar no terreno divino. Os medos se tornavam toleráveis; bicho-papão, cuca, fantasmas. A imaginação ajudava a vencê-los.
Para nós, ser criança significava abraçar a liberdade. Os joelhos ralados sangravam, doíam, no entanto, nenhuma dor nos intimidava a não continuar. E hoje, a nossa angústia maior reside no coração. Não há pomada, spray, merthiolate, ou band-aid que consiga amenizar o que sentimos.
O tempo corre lá fora, crescemos como árvores, florescemos, geramos frutos bons e ruins. A criança desprovida de preocupação amadurece.
Somos adultos, os boletos bancários são nossos visitantes mensais e pontuais. Aprendemos que o amor machuca, cria feridas rasas, agudas e profundas, nas quais nem beijo de mãe é capaz de curá-las.
O fato é que pouco a pouco, diluímos nossas perspectivas, vamos apenas reproduzindo os sonhos já sonhados. Logo, o coração ardente adormece. Somos apenas seres apáticos à mercê do moralismo e convenções. Priorizamos a presença e não há essência de viver.
E assim, esquecemos a nossa funcionalidade e cedemos razão àquilo que desejam para nós. Como seria bom, voltarmos a ter o olhar de criança. Ver o mundo sem medo, mágoas e desilusões.
Em algum lugar desse espaço, a nossa criança ainda existe. Pode ser nas páginas de determinado livro, no vento que nos sopra, no balão solto entre o firmamento e até mesmo, nas cantigas de ninar do tempo.
Em algum lugar desse espaço, a nossa criança ainda existe. Pode ser nas páginas de determinado livro, no vento que nos sopra, no balão solto entre o firmamento e até mesmo, nas cantigas de ninar do tempo.
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