Como não te (a)mar?

"E essa entrega se refletiu na minha escrita, trouxe-me paz de espírito e libertou-me de tudo o que já não me era."


REVISTA VICEJAR - LITERATURA 



Dizem que existe amor à primeira vista, mas também há quem diga que o amor se conquista aos poucos, que nos vai derrubando os medos, cativando, aceitando, e é esse que perdura, que se faz em nosso corpo carne, e em nosso coração se torna eterno. Assim fomos nós.

Refugiei-me perto de ti, procurando vencer meu cansaço e recuperar novas forças, sempre ouvi dizer desde menina que o mar curava, e as pessoas eram levadas temporadas para junto dele em busca dessa ajuda e que a água salgada limpava nossas energias. Assim o fiz e me ancorei em um novo princípio.

E nessa procura, entreguei meu coração...

Pendem-me nas pálpebras todos os cansaços
De meus olhos, apenas uma pequena nesga de
brilho se lhes rebela
Desenham-se-me na íris todos os tormentos
Que em minha expressão se espelha

Em cumplicidade
Também meus lábios se lhes juntam
E se cerram conformados
Saudosos de todos os momentos
Em que em loucura foram por ti beijados

O tempo se escusa a seguir a meus lamentos
Sucumbindo em protesto lho peço
Mas me exorta a despertar
Me leva a ver o mar
E a sentir em meu rosto a brisa do vento

Ah, se soubesse ele... 
Como eram os beijos dos lábios do meu amor
Se sentaria contigo na areia
Condoído da minha dor...

E essa entrega se refletiu na minha escrita, trouxe-me paz de espírito e libertou-me de tudo o que já não me era.

Amor, oh amor...
Que te desfizeste em espuma na bruma da minha memória
Eu, em tua busca a olhos cegos me lancei nua às ondas
Na esperança de nelas contigo também eu me dissolver
E de novo, juntos nessa imensidão
Fazermos amor em vagarosas vagas
Deitadas sobre a areia e ao mar retornadas

Amor, oh amor...
Já nem te sinto o sal que me queimava a língua
Nem tampouco o rocio a mar
Este corpo despido privado de sentidos
Sente agora apenas o queimor que lhe doira a pele
E o cansaço em seus pés descalços
Do trilho incessante e inglório percorrido junto à quebra das marés
Na procura de teus passos...

Assim te confidenciei, me escutaste, e assim começou a nossa estória de amor...

Sempre me perguntaram qual a nossa preferência entre campo e mar, confesso, nunca foste a minha escolha, o verde sempre me inspirou, rejuvenesceu, energizou e ainda assim o é, e, no entanto, algo em mim mudou no dia em que mais que te olhar, te "VI", e me apaixonei...
 
À minha frente te apresentavas
Te olhava em imensidão, poderoso
E sentada na areia sozinha
Não me sentia pequenina, mas rainha...
Porque embora te visse soberano, grandioso
Me podendo destronar a cada momento
A meus pés te quebravas delicadamente
Respeitosamente como que em vênia
E depois retrocedias...
Como não te (a)mar?

Mar...
Por vezes lia Sophia de Mello Breyner Andresen, apaixonada por ti, e um excerto específico dizia: "quando eu morrer voltarei para buscar os instantes que não vivi junto ao mar", e pensava, que fascínio a envolve e inspira com tanto ardor. Pensava, e agora sei, também eu aos poucos, fui seduzida.

Talvez porque agora me visses só, quando outrora te visitava acompanhada, e talvez por respeito não te mostrasses, talvez, só talvez...
A verdade é que te vi, te senti e me encantei...

Encantas-me...
De cada vez que me passeio junto a ti
Te vais aproximando aos poucos
E cauteloso, retrocedendo meio envergonhado
O percebo, te olho e sorrio
E tu, num acto de rebeldia, impulsivo
Te alongas um pouco mais em uma de tuas vagas
E me vens acariciar os pés
Mas logo te vais, talvez receoso de tua ousadia
Ah... mas te amei sentir
Me banhando delicadamente em suave espuma branca
Como se tivesses medo de te mostrar em bruto
Te olho novamente, e novamente te sorrio
Em resposta, ruges ferozmente
Me mostrando a tua força, glorioso
E de novo me vens banhar
Mas agora, seguro da minha aceitação
Não te receio, e até anseio te sentir em meu corpo
E aos poucos...
Aos poucos, nessa tua recatada sedução, sei
A ti acabarei por me entregar... 

Muito mais poderia aqui vos deixar sobre ele, sim, "ELE", porque agora o vejo assim como um amigo especial, personificado, que me recebe, acolhe, purifica, inspira, escuta e embala.

Assim me é, assim lhe sou...

E naquele momentos junto ao mar ao entardecer
Enquanto o vento me velava os cabelos
E o sol se deitava para mim
Tudo era belo
Tudo era perfeito...




 

 

 TEXTO: Ana Acto 

FACEBOOK: http://www.facebook.com/anaacto 

Ana Acto, nasceu a 5 de abril de 1979 em Tomar, Portugal. Abriu em 2018 nas redes sociais uma página de autora com o seu nome onde partilha a sua escrita em poesia, prosa poética e reflexões. Escreve-nos sobre a vida, e sobre o amor em todas as suas vertentes, romantismo, perda, esperança e sensualidade. Participante ativa em saraus e tertúlias poéticas e coautora em mais de vinte obras coletivas. Lançou em 2020 o seu primeiro livro de poesia, intitulado “NUA”. Para além do gosto pelas letras, tem diversas formações em terapias holísticas e alternativas.

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