“Diz que descobriu a esperança no dia em que levantou os olhos para sentir melhor o cheiro do vento.”
REVISTA VICEJAR – LITERATURA
_____Isa Bel. Quando, um dia a conheci, senti de imediato que era daquelas pessoas capazes desse feito único de pousar o olhar nas estrelas. Penso que seria para as adivinhar. Porque soletrava o nome de cada uma, como se lhe fossem pertença do coração.
_____Perguntavam-lhe muitas vezes, porque perdia tempo a namorar com os sonhos. Respondia, com os olhos carregados de distâncias, que o tempo... Bem, o tempo serve para guardar vidas irrepetíveis. Por isso se perdia, assim, nele.
_____Vi-a, muitas vezes, presa nos timbres das sombras onde se permitia descansar das fadigas do espírito. Sabia que, por dentro, murmurava para si própria uma canção de embalar, cujas palavras só o silêncio tinha permissão para entender: “Os pássaros… é tão profundo o som naquele trinar a engrandecer o Ser de ser completo e inteiro!” E a tranquilidade era-lhe apenas isso, aquela música infinita num cair de tarde a aconchegar o horizonte. E um raio de sol que não lhe escondia o sussurro de um outono já a prometer-lhe a alma. O céu inteiro a olhá-la, oferecia-lhe esse instante com cheiro a lilases!
_____– Ainda sou livre de acreditar que a vida só vale a pena quando os sentidos saboreiam todos os detalhes de um único momento. - Declamava, baixinho, como se brincasse com as letras de um poema.
_____Sabia de cor todos os segredos da terra. Os muros e as cores, as árvores e os cheiros, a transparência da chuva e a exatidão dos insetos, a solidão das nuvens...
_____– Com eles, visto as roupas das minhas memórias no espaço exato de um momento. – Ouvia-a, certa vez, murmurar.
_____Desenhavam-se-lhe no rosto as palavras dos outros como uma brasa que queima por dentro. Às vezes mel. Às vezes fel. Se o mundo nos dói, não quer dizer que destrói... E seguia em frente. O mar dos braços num abraço a si mesma. É que Isa Bel tinha esse dom: a brisa do seu ser aquietava-se-lhe no calor de um simples toque, mesmo que ainda por inventar. Depois, livre, partia num baloiço à procura de todos os céus possíveis...
_____Diz que descobriu a esperança no dia em que levantou os olhos para sentir melhor o cheiro do vento. O instante em que ficou a saber que dentro dela, todas as almas podiam ser infinitas.
_____Por isso, foi ao senti-la silenciosa na lonjura daquela janela, que lhe perguntei:
_____– Então, qual o medo de sonhar quando se carrega, assim, a fé no olhar?...
_____Não me respondeu. Lentamente, limpou o canto das lágrimas.
_____Creio que todos os gestos guardam os segredos de uma vida.
TEXTO: Paula Freire
FACEBOOK: https://www.facebook.com/su.lima834
Natural de Lourenço Marques, Moçambique, reside atualmente em Vila Nova de Gaia, Portugal. Com formação académica em Psicologia e especialização em Psicoterapia, dedicou vários anos do seu percurso profissional à formação de adultos, nas áreas das Relações Humanas e do Auto-Conhecimento, bem como à prática de clínica privada. Desde muito cedo desenvolveu o gosto pela leitura e pela escrita, tendo colaborado regularmente com publicações em meios de comunicação da imprensa local. O desenho foi sempre outra das suas paixões, sendo autora das imagens de capa de duas obras poéticas lançadas pela Editora Imagem e Publicações em 2021. Há alguns anos, descobriu-se no seu ‘amor’ pela arte da fotografia onde aprecia retratar, em particular, a beleza feminina e a dimensão artística dos elementos da natureza.
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A articulista atua como Colaboradora deste Blog e o texto acima expressa somente o ponto de vista da autora, sendo o conteúdo de sua total responsabilidade.
Texto maravilhoso!
ResponderExcluirNossa língua fazendo a Roda maravilhosa da cultura.
Parabéns pelo texto!
Obrigada Revista Vicejar!
A Revista Vicejar fica muito feliz por estreitar o relacionamento entre autores brasileiros e portugueses, sempre atenta a qualidade dos textos. Agradecemos pela atenção de registrar seu comentário e pelas palavras de incentivo.
ExcluirMuito obrigado à Profa. Maria Barbosa Lima (PORTOMÁGICO) pela leitura de mais este texto e pela gentileza das visitas frequentes ao blog "Revista Vicejar". Grato também por participar ativamente dessa "Roda maravilhosa da cultura", estimulando as relações luso-brasileiras.
ExcluirJuntos e fazendo a roda crescer e girar.
ExcluirUm.grande abraço!
Agradeço as palavras de Maria Barbosa Lima (PORTOMÁGICO). Grande é a minha satisfação por poder contribuir com um pouco de mim, na qualidade de colaboradora, para este fantástico mundo de letras da Revista Vicejar.
ResponderExcluirGosto tanto, mas tanto de ler a Paula Freire, que sentir maravilhoso que transpõe nas palavras de uma forma encantandora
ResponderExcluirE sonho ao lê-la.
Agradeço a gentileza das suas palavras. Para quem escreve, é sempre agradável e gratificante receber o feedback positivo do leitor. E igualmente perceber que, de alguma forma, a emoção com que escreveu tenha ido ao encontro do sentimento do mesmo. Um incentivo, sempre, para que a palavra tenha continuidade. Muito obrigada.
ExcluirEstória linda que tocou o meu coração com palavras cheias de sentimento e de magia. Obrigado por partilhar. 🌷
ResponderExcluirAgradeço também eu a leitura da crónica e manifesto a minha satisfação sincera por ter apreciado dessa forma emotiva. Obrigada.
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