Noite morna

“Em cada livro perfilado, nas estantes empoeiradas há de existir ainda a formosura da esperança.”

REVISTA VICEJAR – LITERATURA ( Crônica )



_____Fim de domingo, debruçada sobre a escrivaninha da pequena sala, rascunho algumas palavras secas e com raízes retorcidas, impregnadas de fungos. Lá fora, vozes exaltadas gritam, fogos de artifícios estalam no céu de uma noite morna. Aqui, meu coração apenas se inibe. Tétrico em relação ao futuro que os homens dizem agora escrever.

_____Seria interessante ler neste momento de tanta veemência partidária, uma crônica machadiana repleta de sarcasmos e ironias desfilando nas entrelinhas do cinismo. Melhor ainda seria ler Drummond com todo seu sentimento de mundo, versificado com letras gauche. Do amanhã seguimos, coroados com as dúvidas que nos abraçam fortemente. Sim, o mundo é página constantemente escrita pelos homens. E há aqueles que não se cansam e muito menos se envergonham em escrever sua história, com tintas de hostilidade e discórdia. Há muitos Policarpos Quaresmas espalhados por aí, entre o ideal e o real vivem em suas bolhas de ingenuidade.

_____É preciso cerrar os olhos e esquecer. Tudo se dissipa e aquilo que se acredita há de ser. Lá fora, gritos e buzinas. Aqui dentro apenas o silêncio. O coração bate, porque apanha para ti, os poemas que tens medo de entregar-me.

_____Meu sonho será sempre sonhado. Nas esquinas, nas salas de aula, nas ruas, nos ginásios, nos quartos com suas janelas fechadas. Em cada livro perfilado, nas estantes empoeiradas há de existir ainda a formosura da esperança.

_____Nossa noite é morna, estrelas se escondem entre pequenos farrapos de nuvens. Carros desfilam frenéticos sobre o asfalto quente. Estendo minha mão para você, aperte-a contra seu peito. Não tenhas medo, sabemos que o amor é onipotente e ele supera toda cólera exibida nas catedrais. Somos fortes, mesmo que abatidos, entenda, nada pode ser mais do que eu e você. Hoje não podemos morrer. É preciso viver, para sermos a resistência do amor.

 

 TEXTO: Mayanna Velame 
INSTAGRAM: @portugues_amoroso 
Mayanna Velame nasceu em Manaus, em 1983. É graduada em Letras - Língua Portuguesa, pela Universidade Federal do Amazonas. É autora do livro "Português Amoroso" (Editora Madrepérola/Maio de 2020). Escreve periodicamente contos, crônicas e poesias para os sites: "Revista Vicejar", "Revista Conexão Literatura", "Texto Garagem" e "Corvo Literário".
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A articulista atua como Colaboradora deste Blog e o texto acima expressa somente o ponto de vista da autora, sendo o conteúdo de sua total responsabilidade.

             
                       

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