Coração selvagem

"A Capital do Mormaço, como assim é conhecida, evapora os preconceitos, abraça os imigrantes e tagarela um sotaque chiado que soa como um risco para quem o ouve." 

REVISTA VICEJAR – LITERATURA ( Crônica ) 

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_____É verão, ganho uma esquina e encontro uma frase pichada no muro de um bar: “Não há amor em Manaus”. A Paris dos Trópicos é assim — segue escaldante e úmida. Transpira seus moradores como a seiva a absorver os nutrientes do solo.

_____Manaus não se esconde, ela é arisca e se revela nas ruas feitas de calor e cimento. Penteia seus cabelos nas margens do rio Negro e beija os pés da noite com seus lábios ácidos. A Capital do Mormaço, como assim é conhecida, evapora os preconceitos, abraça os imigrantes e tagarela um sotaque chiado que soa como um risco para quem o ouve.

_____Não há amor em Manaus, mas eu luto contra essa afirmação. Porque essa cidade tórrida, fincada na floresta Amazônica, tritura palavras perdidas, nos córregos banhados pelas chuvas torrenciais. Do céu nublado, ou infinitamente azul. Manaus sombreia minha face através dos benjamins centenários da Ramos Ferreira.

_____De hora em hora, o relógio da Matriz já não me apressa os passos. Há um encanto que ainda permanece impregnado nas praças, cemitérios e aeroportos dessa cidade. Manaus equilibra suas dores sobre a linha do Equador. Dos teus prédios, que tentam alcançar o céu, araras vermelhas conseguem contradizer esse espaço, ora esverdeado, ora cinzento.

_____Atire o primeiro caroço de tucumã, quem provar a ausência de amor em Manaus. Outro dia, eu estive com ele, conversamos sobre o futuro da Zona Franca e principalmente, dialogamos a respeito da nossa biodiversidade. O amor mostrava-se bem e antes da despedida, ofereceu-me um gole de suco de cupuaçu.

_____Dizem que ele foi visto pela última vez, caminhando no cais do porto. E poético como ele é, deve ter embarcado para algum encontro com as águas. Não há amor em Manaus, muros com essa frase continuarão à mostra.

_____Manaus é um coração selvagem, que não se ajoelha e muito menos se cala. Cantarola com os pássaros e no arrebol diário, oferece um horizonte incendiado, para quem acredita, que o amor sempre está aqui. 


 TEXTO: Mayanna Velame 
INSTAGRAM: @portugues_amoroso 
Mayanna Velame nasceu em Manaus, em 1983. É graduada em Letras - Língua Portuguesa, pela Universidade Federal do Amazonas. É autora do livro "Português Amoroso" (Editora Madrepérola/Maio de 2020). Escreve periodicamente contos, crônicas e poesias para os sites: "Revista Vicejar", "Revista Conexão Literatura", "Texto Garagem" e "Corvo Literário".
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