"As cartas tinham mãos que enlaçavam. Tinham corpo que se fazia presente sobre a distância das emoções ansiosas de chegar. As cartas eram os nossos olhos no coração do outro."
REVISTA VICEJAR – LITERATURA ( Crônica )
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_____Escreve-me uma carta, pediste-me.
Escreve-me uma carta...
_____E eu escrevo. Com o toque da pele sobre
a textura delicada do papel, escrevo-te uma carta. Escrevo-te uma carta com as
palavras que não saberia pronunciar.
_____Poderia ser a primeira de muitas
cartas.
_____Mas hoje, sabes, já não se escrevem
cartas de amor, meu amor. Perdeu-se a magia única da surpresa do sorriso, o
encontro das letras descobertas dedo a dedo, despidas linha a linha com a
suavidade de muitas pétalas que caem aos pés nus de quem se ama.
_____As cartas tinham mãos que enlaçavam.
Tinham corpo que se fazia presente sobre a distância das emoções ansiosas de
chegar. As cartas eram os nossos olhos no coração do outro.
_____Traziam consigo a alegria de todas as
esperas. Uma forma tão própria de abrir portas e janelas no interrompido
destino do tempo. Um modo tão único de prever a voz que nos permanecia nas
memórias mais doces. Um modo tão especial de não apenas tocar, mas de nos
afundar em mãos imaginadas, em lábios silenciosos.
_____Escreve-me uma carta, pediste-me.
_____Permite-me, então, que o teu olhar se
encerre dentro de mim e deixa-me dançar ao compasso do pensamento que cumpre as
letras de toda a nossa intimidade. E nele, oferecer-te a soma de tudo o que te
sinto.
_____Braço dado com a imaginação do teu
suspirado abraço, como poética confidência, te confesso que o perfume da nossa
carta ganhou forma no sentir do que, um dia, me sussurraste em surdina,
enquanto elogiavas a minha forma sincera de sorrir. Um sorriso largo, livre,
vivo. É assim que gosto de te ver, disseste.
_____Como gostas de me ver desprevenida
debaixo do teu olhar atento. Cabelos desalinhados, alça à vista sob uma manga
desavergonhada descida sobre o ombro. Um retorcer pueril de lábios que não
adivinham os teus olhos de gato.
_____Como gostas de me ver no dedilhar dos
poemas que duvidas que te escrevo.
_____Como gostas de me ver nas sombras e
luzes das fotografias que afirmas não gostares de ver, só porque não foram
pensadas apenas para ti.
_____Como gostas de me (escre)ver num umbral
de páginas brancas onde um tinteiro de alquimia te serve de inspiração.
_____Foi quando te entendi a simplicidade
que seduz. Foi apenas quando te entendi nos pormenores escondidos do que te
comove.
_____Talvez agora descubra porque me amas e
eu nem saiba.
_____Porque há amores assim, sem sílabas,
amores que não sabem dizer.
_____Às vezes, seriam precisas cartas de
amor, como esta, que me pediste. Cartas verdadeiras de amor, para (nos)
aprendermos a escutar.
TEXTO: Paula Freire
FACEBOOK: Flor De Lyz - Poesia & Fotografia
Paula Freire é natural de Lourenço Marques, Moçambique, reside atualmente em Vila Nova de Gaia, Portugal. Com formação académica em Psicologia e especialização em Psicoterapia, dedicou vários anos do seu percurso profissional à formação de adultos, nas áreas das Relações Humanas e do Auto-Conhecimento, bem como à prática de clínica privada. Desde muito cedo desenvolveu o gosto pela leitura e pela escrita, tendo colaborado regularmente com publicações em meios de comunicação da imprensa local. O desenho foi sempre outra das suas paixões, sendo autora das imagens de capa de duas obras poéticas lançadas pela Editora Imagem e Publicações em 2021. É também desta editora o livro de poesia de sua autoria, "Lírio: Flor-de-Lis" (2022). Há alguns anos, descobriu-se no seu ‘amor’ pela arte da fotografia onde aprecia retratar, em particular, a beleza feminina e a dimensão artística dos elementos da natureza, tendo organizado uma exposição com trabalhos seus, na cidade do Porto (a convite da Casa da Beira Alta), em setembro de 2022, sob o título: "Um Outono no Feminino: De Amor e de ser Mulher".
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A articulista atua como Colaboradora deste Blog e o texto acima expressa somente o ponto de vista da autora, sendo o conteúdo de sua total responsabilidade.
Parabéns Paula Freire (Flor de Lys), pela sensibilidade, ao trazer/relembrar um laço de comunicar as emoções tão belo💜
ResponderExcluirAgradeço o comentário sobre a minha crónica e a gentileza das palavras.
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