“A morte agonizante e o isolamento das comunidades ribeirinhas e indígenas são cenas que devastam o coração e transbordam revolta e descontentamento."
REVISTA VICEJAR – LITERATURA ( Crônica )
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_____Enquanto escrevo essa crônica, o suor umedece minhas têmporas. O leitor que me perdoe, mas para quem mora próximo à Linha do Equador, padecer com a infinitude do calor é um clichê diário. Nesse tempo, onde o extremo se sobrepuja a todos, uma unanimidade ressoa entre os cronistas e parece que todos resolveram destravar suas palavras, redigindo sobre as queimadas e a forte seca que acomete nosso país.
_____Para quem mora numa metrópole fincada na Amazônia, o sentimento de pesar é ainda maior. Os rios caudalosos da região tornaram-se desertos, terra árida, cemitério de peixes e botos. A morte agonizante e o isolamento das comunidades ribeirinhas e indígenas são cenas que devastam o coração e transbordam revolta e descontentamento. É óbvio que estamos no período da estiagem, mas a cada ano, o cenário apocalíptico ganha novos capítulos e o enredo de um suposto fim, tem se mostrado franco a cada parágrafo escrito com a tinta da incompetência dos gestores públicos e do descaso demagógico daqueles que vivem da terra.
_____Durante anos em que vivo nessa terra de sobrenome quentura, nunca vi o céu azul de verão ser sucumbido pela densidade das fumaças, oriundas dos focos de queimadas. O dito “pulmão do mundo” segue sufocado não apenas pelo fogaréu que acende nosso fim, mas também, pela hipocrisia daqueles que fizeram da Amazônia, um discurso eleitoreiro e que no final, nada se viu em prol do verde.
_____O homem por si só, possui o dom de destruir sua própria casa. Muitos se dizem acreditar em Deus, mas são incapazes de cuidar do habitat que a eles fora dado. Entre a crença e a razão, estamos perdendo. Achamos que somos o suficiente, quando nem toda tecnologia poderá nos dá uma sobrevida.
_____O único fato que ainda me anima, é olhar para a janela do meu quarto e avistar alguns passarinhos cantantes nos galhos do meu mamoeiro. Enquanto eu ouvir seus assobios é sinal de que a natureza resiste e persiste em continuar. O prelúdio do fim é intenso, por isso pergunto: haverá alguma arca para nos salvar? Foguetes nos levarão para Marte? Creio que os marcianos negariam nosso visto na fila da imigração.
_____Com o coração em brasa, despeço-me dessa crônica. Se o leitor teve a chance de lê-la é porque não é o fim. No meu caso, o que me resta é olhar para o céu e clamar pela chuva, São Pedro não anda fazendo seu serviço direito. Mas eu o entendo, ele é apenas mais um subordinado na hierarquia celestial. Pensando bem, não tem problema, quem sabe o meteoro Apophis não nos faça uma visita antes da hora e retire de vez e para sempre, todas as nossas lamúrias.
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