Doutrinação

Mas o problema da sociedade brasileira somos nós, professores, "perversos e doutrinadores".

REVISTA VICEJAR - ARTIGOS E OPINIÕES


Até há aproximadamente dois anos atrás era relativamente comum visualizar ou receber em redes sociais mensagens relativas à coragem e dedicação dos professores brasileiros, que persistiam na profissão mesmo com os inúmeros problemas enfrentados, mesmo recebendo um dos menores salários para a profissão, se comparados a outros países, mesmo recebendo um salário ínfimo, se comparado aos salários dos políticos brasileiros.

Em pouco menos de dois anos e a despeito de todas as crescentes adversidades enfrentadas pelos educadores neste país, como mostram pesquisas internacionais sobre o assunto (falarei sobre elas abaixo), esse panorama veio mudando lenta e sorrateiramente a ponto de hoje, um professor, que antes era até chamado de herói, ser taxado de manipulador, doutrinador e, até mesmo, perverso.

Diante disso, não pude me furtar a pesquisar e ponderar um pouco sobre o assunto e acabei percebendo alguns detalhes interessantes.

Grande parte dos políticos brasileiros, que foram eleitos por milhares e até milhões de votos, e, certamente, influenciaram o modo de pensar de uma boa parte de seu eleitorado com seus discursos, assim que assumem o cargo, unem-se a bancadas diversas, geralmente preocupadas com interesses individuais e não coletivos, e votam para benefícios particulares e até mesmo pessoais, ao invés de cuidar do Patrimônio Público, sempre usando discursos eloquentes.

Boa parte dos jornalistas, assumindo posições políticas e até partidárias muito bem definidas, apresentam a milhares e até milhões de pessoas seus artigos e opiniões fazendo uso de meias verdades (a metade que lhe interessa, é claro), numa tentativa às vezes até desesperada de confirmar suas convicções.

Influenciadores digitais, muitas vezes com milhões de seguidores, grande parte, crianças, adolescentes e jovens (a mesma faixa etária de nossos alunos, sobre os quais somos acusados de doutrinação) usam e abusam de fake news e opiniões sem embasamento em fatos para disseminar suas pretensas verdades.

Até mesmo alguns padres e pastores desviam-se de suas funções de ministro religioso, cuidador de almas e do mundo espiritual, e defendem para centenas ou milhares de pessoas suas ideias políticas com mais veemência do que suas convicções religiosas.

Mas o problema da sociedade brasileira somos nós, educadores!

A Varkey Foundation, uma fundação dedicada a melhoria da educação mundial, cuja sede principal fica em Londres, na Inglaterra, e é responsável pela entrega do Global Teacher Prize, conhecido como “Nobel” da educação, anunciou em novembro último que em sua recente pesquisa, o professor brasileiro está em último lugar no ranking de prestígio dentre 35 países estudados.

Já em agosto de 2017, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), com sede em Paris, na França, havia anunciado que o Brasil ocupava o primeiro lugar no ranking da violência contra professores. Mesmo assim, nós, professores, fazemos de tudo para devolver à sociedade cidadãos cultos, conscientes e críticos.

Mas o problema da sociedade brasileira somos nós, professores, “perversos e doutrinadores”.

E enquanto esse mantra continua sendo repetido à exaustão, somos cada vez mais humilhados e subjugados.








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