A travessia

"Vida é bagagem de memória. Vivemos para ficar, mas também para esquecer. E dos cortes cicatrizados, realizamos sinais de conquista ou aprendizado." 


REVISTA VICEJAR – LITERATURA ( Crônica ) 



_____Só estamos em nós, quando somos sozinhos. É preciso sangrar, rasgar a pele e deixá-la em carne crua. O trajeto há de ser tortuoso e a queda nunca pode significar o fim. Comeremos pó, sentiremos sede. Contra nossas retinas, o vento soprará areia. Do calor ao frio, caminharemos, sentindo o peso de tudo aquilo que negamos.

_____Entre curvas e retas, nossos passos, embora fadigados, marcham rumo ao horizonte. Somente a ele importa chegar. Cegos, mapearemos o risco. Porque viver é um risco e somente assim a travessia pode acontecer.

_____No silêncio da mansidão ou nos ruídos da incerteza, o coração não para. Ele é músculo exercitado para saber bater. E com isso, não há mais tempo para olharmos para trás. Vida é bagagem de memória. Vivemos para ficar, mas também para esquecer. E dos cortes cicatrizados, realizamos sinais de conquista ou aprendizado.

_____O aqui não está distante do lá. Por isso, não há quilômetros, anos ou dias, que possam nos separar da nossa Terra Prometida. Ela já está em seu devido lugar, deslumbrando a sua glória.

_____Quanto a nós, é preciso sair da aldeia, da prisão fria e escura, agonizante de sonhos. Logo, o Sol irá nascer, aquecerá nossos desejos, enquanto a chuva regará o amor existente.

_____Escravizados pelas circunstâncias, acorrentamos o viver. E realizar a travessia, ainda sim, é uma forma de se sentir um tanto mais vivo. A dor é ferina e seu reconhecimento é sinal de que não morremos.

_____Esbravejando utopias, rompemos de vez com o medo. E sabemos, o quanto ele é poderoso em anular nossas atitudes. Quando estamos sós, sabemos quem somos. Não há vozes a ecoar nossos erros e acertos. Há apenas o desejo. O mundo exalta os montes, mora nos continentes, embala-se nas ondas do mar e revela-se nas tempestades. Nós o acompanhamos, ora como objetos soltos no ar, ora como protagonistas das mais triunfantes conquistas.

_____Ao destino, não nos resta qualquer tipo de pergunta. Saibamos apenas obedecer a hora exata de partir. Como um povo cansado do cativeiro, a rebeldia é arma pungente, para encorajar a cada um, que queira realizar a sua travessia.


 TEXTO: Mayanna Velame 
INSTAGRAM: @portugues_amoroso 
Mayanna Velame nasceu em Manaus, em 1983. É graduada em Letras - Língua Portuguesa, pela Universidade Federal do Amazonas. É autora do livro "Português Amoroso" (Editora Madrepérola/Maio de 2020). Escreve periodicamente contos, crônicas e poesias para os sites: "Revista Vicejar", "Revista Conexão Literatura", "Texto Garagem" e "Corvo Literário".
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A articulista atua como Colaboradora deste Blog e o texto acima expressa somente o ponto de vista da autora, sendo o conteúdo de sua total responsabilidade. 

             
                       

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