Carona

"Para buscar você, nos destinos da vida, eu pisava fundo no acelerador, como se tal atitude, pudesse antecipar nosso encontro."  

REVISTA VICEJAR – LITERATURA ( Crônica ) 

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_____Chave na ignição, minhas pernas tremulam no ritmo do motor. O automóvel de cor chumbo, logo ganhará as ruas e avenidas dessa cidade, que nem conhece e muito menos sabe meu nome. No banco carona, embora exista apenas o vazio. Eu ainda sinto o peso da tua presença, o emanar do teu perfume e a tua insistência em mudar a estação da rádio. 

_____Eu nunca me importei com essa tua mania, em não concordar com meus gostos musicais. Até porque, havia teu corpo aqui, ao meu lado, com teus olhos graúdos e sensatos, a examinar as idas e vindas das trocas de marchas. 

_____Hoje, esse banco carona traz algumas reminiscências, que agora, são elas que se assentam, acompanhando-me aonde quer que eu vá. Esse carro sabe muito bem, de quantas viagens nós realizamos. E você, de vez em quando, emitia palpites do meu dirigir, atiçando minha interminável paciência. 

_____O velocímetro dispara, feito um coração, que deseja ardentemente bater, por algum motivo. Durante vários momentos, esse carro foi meu divã. Testemunhou sua chegada e sua despedida. Flagrou teus choros, fotografou teus sorrisos, concordou com tuas penalidades e fraquezas. 

_____Em meio ao caos do trânsito, dirigir na tua companhia, foi meu maior presente. E tu, se bem me lembro, colocavas o cinto de segurança, não por medo das minhas manobras. Mas na certeza, que o improvável sempre pode nos acometer. 

_____Para buscar você, nos destinos da vida, eu pisava fundo no acelerador, como se tal atitude, pudesse antecipar nosso encontro. Torcia para os semáforos permanecerem verdes e se fosse para te deixar em casa, desejava engarrafamentos para tardar tua ida. 

_____Agora, suponho que todos os quilômetros percorridos, estão gravados para sempre nas esquinas que cruzamos. Na velocidade do tempo, demos nossa largada, contornamos curvas, tracejamos linhas retas. 

_____Aos solavancos, não nos atentamos, que a faixa de chegada fora previamente desenhada. E que frear, foi a única solução moderada. O carro ainda acelera, é só mais um automóvel a seguir, nas ruas dessa metrópole que nos ignorou. Ele segue no seu ritmo, numa velocidade pertencente só a ele, e não mais, a história de nós dois. 


 TEXTO: Mayanna Velame 
INSTAGRAM: @portugues_amoroso 
Mayanna Velame é escritora, poeta e professora nascida em Manaus. É autora dos livros: "Português Amoroso" (2020) e "Cactos e Tubarões" (2023). Foi finalista do Prêmio Selo Off Flip (2022), na categoria conto e vencedora do 6º FLIM (2023), promovido pela Academia Volta-redondense de Letras com o conto: "Professor Jeremias Bartolo". 
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